JOÃO BOBO
- Sylvio Nunes
- há 4 dias
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"Conheci numa cidade há muitos anos passados
Um bobo que andava rindo e o pobre era retardado
A molecada vadia não dava paz ao coitado
Por mais que dele judiasse nunca ficava zangado
Mas nem sempre um demente tem os nervos controlados
Vinte anos de chacota suportou neste povoado
Por quatro estudantes um dia João Bobo foi rodeado
Ameaçaram lhe bater só pra ver ele zangado
João Bobo pegou uma pedra e atirou num dos malvados
Seu agressor desviou, tirando o corpo de lado
A pedra pegou em cheio no filho do delegado
E o pobrezinho morreu dali minutos passados
Aquele bobo foi preso pra mais logo ser julgado
No dia do julgamento foi surpresa pros jurados
Entrou pelo fórum adentro um mocinho bem trajado
Apresentou pro juiz carteira de advogado
Terminando acusação, o réu ficou arrasado
E o juiz deu a palavra ao mocinho advogado
"Meritíssimo juiz e senhores jurados
Meritíssimo juiz e senhores jurados
Meritíssimo juiz e senhores jurados"
"Silêncio, o senhor não tem argumentos para defesa do réu"
"É neste ponto, senhor juiz que eu queria ter chegado
O senhor não tolerou três vezes ser pronunciado
Chamando a sua atenção e dos senhores jurados
Vinte anos esse bobo suportou no povoado
Insulta de toda espécie e nunca ficou zangado
Ouçam a voz da consciência e julguem senhores jurados"
Foi essa a primeira causa do mocinho advogado
Vitória bem merecida por ele foi alcançada
Ai, João Bobo foi libertado"
Tião Carreiro e Pardinho
Entre 1932 e 1934, anos da Revolução Constitucionalista, da aprovação do primeiro Código Eleitoral brasileiro, da ascensão de Hitler e da promulgação da nova Constituição brasileira nasceram dois grandes nomes da música sertaneja, Tião Carreiro e Pardinho. Dentre dezenas de músicas, uma se destaca por conter os elementos do assédio moral.
O transtorno de personalidade sádica é um padrão de comportamento sádico que se caracteriza por agressão recorrente e crueldade. Pessoas com esse transtorno podem usar violência e agressão para controlar e dominar os outros. Nada de novo no reino da Dinamarca que isso pode ser arquitetado pelas mentes psicopatas mais sórdidas.
O Congresso brasileiro, por exemplo, tal como a maioria das instituições religiosas, está populado de criaturas que distribuem de forma explícita ou velada, violência, ódio e agressividade discursiva. O que não está distante de ser esta uma representação simbólica e manifesta da sociedade brasileira.
O adverso no âmbito da agressividade e do desejo estão muito próximos quando o outro é tratado não como inimigo das armas discursivas, da opinião ou simplesmente do posicionamento ideológico, mas como adversários existenciais. Ah se pudessemos atropelar um motoqueiro que anos atormenta com aquela buzina incessante, só um. Ou aquele que nos furta o celular. Se fizessemos uma pesquisa seria fatal que 90% dos proprietários de carros blindados desejariam esmagar um assaltante armado.
Com base nessa morbidez é permissivo moralmente externar o desejo de que outro morra, desejar a abolição do estado de direito, defender quem matou adversários. Em sentido reverso, é permissivo odiar e ao mesmo tempo ser parte de um conluio de pirataria. Seja miliciano ou cristão, militar ou sacripanta, o jogo se apoia na patranha e é preciso lubrificar as veias da cegueira. a fala que demoniza é simpática à causa da abolição do outro.
Assim o discurso "democrático" dá ares de Conservatória à Mesopotâmia e não retira a maquiagem. Desdenha de Talião e Hamurabi, promove com escárnio e sofisticação, a imoralidade entre cúmplices. E todo o peso do estado de direito, da imprensa livre e do arcabouço social instruído não consegue sequer georreferenciar uma única nau insensata corsários. A esperança ainda flama nas brumas da inação, das calmarias.
Assim, o deputado federal Paulo Magalhães (PSD-BA), velho timoneiro da violência e que em 2001, foi flagrado agredindo com socos e chutes o jornalista Maneca Muniz dentro na Câmara dos Deputados, apresenta relatório e vota cassação do Deputado Glauber Braga. na Comissão de Ética da Câmara. Assim, o grupo desarmado, pacificamente, catolicamente, com erudição e ornamento verbal, aplica a vendetta e violência.
Embora na obra do escritor francês Marquês de Sade, o conceito de "sadismo" tenha conotações principalmente sexuais, há uma certa ereção na derrubada dos princípios morais que estrupam a razão. O cidadão que foi vítima da agressão do parlamentar era um membro ativista do MBL e o seguia com o objetivo de violar sua inteligência emocional. E isso se repetia seja em Brasília ou No Rio de Janeiro, com falas agressivas, provocativas e dolorosas contra a mãe do Deputado que se encontrava já em estado terminal.
Se não existe nisso um elemento de conduta abusiva e reiterada, até mesmo sádica, que atenta contra a dignidade e integridade psicológica ou física de uma pessoa, eu não sei dizer o que é assédio moral.
A questão do Glauber Braga não ser João Bobo é pouco relevante. O que é relevante é que o Deputado Paulo Magalhães, sobrinho do ex-governador Antônio Carlos Magalhães, num prodígio de hipocrisia, declarou em seu voto: “Esta Casa não deve tolerar comportamentos descomedidos e reações imoderadas de seus membros”.
O fato do parlamentar reagir de forma desmedida ao assédio em tempo integral não é tão inaceitável quanto intolerável à nação os ouvidos moucos do assédio em tempo integral que vinha sofrendo.
Tão inaceitável quanto o ardil montado no esteio do momento doloroso de estar com a mãe internada em estado grave, tão inaceitável quanto a concatenação urdida no veio das denúncias reiteradas que ele fazia contra o orçamento secreto que beneficiava o ex-presidente da Câmara e o próprio relator da cassação.
O Deputado Glauber Braga, no frigir dos ovos de codorna de um país surdo e sonâmbulo é o mocinho de si mesmo. É o "moço advogado" que repete a exaustão, para a sociedade, as denúncias de desvio de bilhões de reais para o orçamento secreto.
E que fala à sociedade de forma silenciosa em sua greve de fome: "Meritíssimo juiz e senhores jurados, Meritíssimo juiz e senhores jurados, Meritíssimo juiz e senhores jurados".
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